O assassinato de Herzog na arte | Jardel Dias Cavalcanti | Digestivo Cultural

busca | avançada
63387 visitas/dia
2,0 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Inscrições | 3ª edição do Festival Vórtice
>>> “Poetas Plurais”, que reúne autores de 5 estados brasileiros, será lançada no Instituto Caleidos
>>> Terminal Sapopemba é palco para o evento A Quebrada É Boa realizado pelo Monarckas
>>> Núcleo de Artes Cênicas (NAC) divulga temporada de estreia do espetáculo Ilhas Tropicais
>>> Sesc Belenzinho encerra a mostra Verso Livre com Bruna Lucchesi no show Berros e Poesia
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Esporte de risco
>>> Tito Leite atravessa o deserto com poesia
>>> Sim, Thomas Bernhard
Colunistas
Últimos Posts
>>> Glenn Greenwald sobre a censura no Brasil de hoje
>>> Fernando Schüler sobre o crime de opinião
>>> Folha:'Censura promovida por Moraes tem de acabar'
>>> Pondé sobre o crime de opinião no Brasil de hoje
>>> Uma nova forma de Macarthismo?
>>> Metallica homenageando Elton John
>>> Fernando Schüler sobre a liberdade de expressão
>>> Confissões de uma jovem leitora
>>> Ray Kurzweil sobre a singularidade (2024)
>>> O robô da Figure e da OpenAI
Últimos Posts
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
>>> O Mal necessário
>>> Guerra. Estupidez e desvario.
>>> Calourada
>>> Apagão
>>> Napoleão, de Ridley de Scott: nem todo poder basta
>>> Sem noção
>>> Ícaro e Satã
>>> Ser ou parecer
Blogueiros
Mais Recentes
>>> A TV paga no Brasil
>>> O Presépio e o Artesanato Figureiro de Taubaté
>>> Change ― and Positioning
>>> Retrato de corpo inteiro de um tirano comum
>>> Arte e liberdade
>>> Literatura em 2000-2009
>>> Abdominal terceirizado - a fronteira
>>> Entrevista com André Fonseca
>>> O bom crioulo
>>> Canarinho velho e pessimista
Mais Recentes
>>> Roma. Guia Visual de Folha de são paulo pela Publifolha (2011)
>>> O Jeito Disney De Encantar Os Clientes + Nos Bastidores da Pixar +Nos Bastidores da Disney de Disney Institute; Bill Capodagli; Lynn Jackson pela Saraiva; Futura (2011)
>>> A Casa Da Minha Infância de Luís Nassif pela Agir (2008)
>>> Atribuições do Assessor Jurídico, do Analista Judiciário e do Técnico Judiciário de Carlos Eduardo Massad pela Intersaberes (2017)
>>> Guia Visual Espanha: O Guia Que Mostra O Que Os Outros So Contam de Vários Autores pela Publifolha (2013)
>>> Para Viver Um Grande Amor: Crônicas E Poemas de Vinicius De Moraes pela Companhia Das Letras (1991)
>>> Florence And Tuscany (eyewitness Travel Guides) de Adele, Catling, Christopher Evans pela Dk Travel (2013)
>>> A Náusea de J. P. Sartre pela Nova Fronteira (1986)
>>> A Fisiologia Do Gosto de Brillat - Savarin pela Companhia De Mesa (2017)
>>> Provence & The Cote D'azur de Rosemary, Williams, Roger, Evans, Adele Bailey pela Dk Eyewitness Travel (2012)
>>> The Innocent de Ian Mcewan pela Vintage Books (1998)
>>> Dk Eyewitness Travel Guide: Portugal de Martin Symington pela Dk Eyewitness Travel (2012)
>>> As Flores Do Mal de Charles Baudelaire pela Nova Fronteira (1985)
>>> A Maldição do Tigre de Colleen Houck pela Arqueiro (2011)
>>> Inferno: The World At War, 1939-1945 de Max Hastings pela Vintage (2012)
>>> Londres - Despertar dos Vampiros Vol. 1 de Sebastian Rook pela Fundamento Educacional (2011)
>>> A Viagem do Tigre de Colleen Houck pela Arqueiro (2012)
>>> Se Você Fosse Minha de Bella Andre pela Novo Conceito (2013)
>>> Anos 70: Ainda Sob A Tempestade Música, literatura, teatro, cinema, televisão de Adauto Novaes pela Senac Rj (2005)
>>> O Destino do Tigre de Colleen Houck pela Arqueiro (2013)
>>> Armas Germes E Aço - Ediçao Comemorativa de Jared Diamond pela Record (2020)
>>> Box A Bicicleta Azul 3 Livros O Sorriso do Diabo Vontade de Viver de Régine Deforges pela Círculo do Livro (1988)
>>> O Sonho do Tigre de Colleen Houck pela Arqueiro (2018)
>>> Trabalhar Por Conta Própria de José Augusto Minarelli pela Gente (1997)
>>> AC/DC Rock N Roll Ao Máximo de Murray Engleheart; Anaud Durieux pela Madras (2016)
COLUNAS

Terça-feira, 30/9/2014
O assassinato de Herzog na arte
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 37400 Acessos

"Diante de um homem morto, todos precisam se definir. Ninguém pode permanecer indiferente. A morte de um homem é a de todos nós". (Gianfrancesco Guarnieri)

Dois artistas abordaram em suas obras a morte do jornalista Vladimir Herzog nas dependências de uma prisão militar. Cildo Meireles e Antonio Henrique Amaral, cada um dentro de estéticas específicas, questionaram a versão de suicídio dada pelos militares à morte de Herzog. Trataremos neste artigo, em primeiro lugar, de relatar "o caso Herzog", e, em seguida, de tratar da obra dos dois artistas citados.

HERZOG, PRISÃO E MORTE:

Vladimir Herzog assumiu na década de 1970 a direção do departamento de telejornalismo da TV Cultura, de São Paulo. Vladimir era membro do Partido Comunista Brasileiro, passando a atuar politicamente no movimento de resistência contra a ditadura.

Em 24 de outubro de 1975 agentes do II Exército convocaram Vladimir para prestar depoimento sobre as ligações que ele mantinha com o Partido Comunista Brasileiro, partido que atuava na ilegalidade durante o regime militar.

No dia seguinte, Herzog compareceu espontaneamente ao DOI-CODI. Permaneceu na prisão com dois jornalistas, George Benigno Jatahy Duque Estrada e Rodolfo Konder. Pela manhã, Vladimir negou seu vínculo com o PCB. Os jornalistas foram levados para um corredor, de onde escutaram uma ordem para que se preparasse a máquina de choques elétricos para tortura. Em seguida, Konder foi levado à tortura, e Herzog não mais foi visto vivo.

O Serviço Nacional de Informações recebeu uma mensagem em Brasília de que naquele dia 25 de outubro o jornalista Vladimir Herzog havia se matado no DOI/CODI/II Exército". Era prática do governo militar que as vítimas de suas torturas e assassinatos fossem dados por suicidas.

As fotos que mostravam os pés de Herzog tocando o chão depõem contra a ideia de suicídio, pois nessa posição o enforcamento seria impossível. O rabino Henry Sobel, líder da comunidade judaica, viu as marcas da tortura e enforcamento em Herzog, o que levou a decisão de que seu enterro fosse realizado no centro do Cemitério Israelita do Butantã, o que implicava em desmentir publicamente a versão oficial de suicídio. A morte de Herzog se espalhou, inclusive em jornais, contrariando as normas de censura estabelecidas pelos militares.

O ato religioso pela morte de Vladimir Herzog se tornou a primeira grande manifestação de protesto contra a violência da ditadura militar. Uniu milhares de pessoas dentro e fora da Catedral da Sé, em São Paulo.



CILDO MEIRELES: PROJETO CÉDULAS

A obra "Inserções em circuitos ideológicos: projeto cédula", de Cildo Meireles, trata da morte do jornalista Vladimir Herzog. Em algumas notas de cruzeiro, moeda corrente no período militar, Meireles carimba a pergunta: "Quem matou Herzog?"

A obra indaga sobre os assassinos de Herzog. Aproveitando a facilidade da circulação das notas de um Cruzeiro (quanto menor o valor, maior a circulação), ele cria uma forma de denúncia sobre o assassinato do jornalista.

O projeto nasceu a partir de um convite para participar da exposição Information (Museu de Arte Moderna de Nova York). Para a exposição foram enviados dois projetos. Um denominado "Projeto coca-cola" e outro denominado "Projeto cédula".

Em ambos o objetivo era gravas informações, opiniões críticas e devolvê-las à circulação. Cildo definiu o projeto a partir do seu contexto e das intenções da obra: 1) a dolorosa realidade político-social-econômica brasileira; 2) a crítica à política americana expansionista, intervencionista, hegemônica; 3) aspectos formais da linguagem - produzir objetos inspirados nos ready-mades de Marcel Duchamp.

Cildo aponta o seu interesse por livrar-se do culto da arte enquanto objeto puro. Para ele, a arte deveria existir "em função do que podiam provocar no corpo social (...) a partir da necessidade de criar um sistema de circulação, de intercâmbio de informações, que não dependesse de nenhum controle centralizado".

O objetivo era minar o controle das informações pelos órgãos do poder (TV, rádio, Imprensa), fazendo circular informações que nesses órgãos seriam censuradas. Tratava-se, na verdade, de se criar uma rede de contra-informações.

Negando também a ideia de que a arte se baseia numa mística do autor ou do mercado, a exigência era de que a obra só existe na medida em que outras pessoas também a praticassem.

Para Cildo, a estética fundamenta a arte, mas a política é que fundamenta a cultura. Como uma espécie de ready-made duchampiano, o objeto mais banal e cotidiano é transformado temporariamente em obra de arte, para depois ser colocado em circulação em seu circuito social original, negando-se, nesse momento, enquanto arte, e tornando-se veículo de uma ação tática clandestina de resistência política, pois, "a pergunta tão incômoda ao regime quanto a uma população amedrontada, circula livremente em cédulas, porque ninguém guardaria ou destruiria dinheiro para esconder a dúvida".

O que interessa na escolha dos materiais, diz Ciro, é que sejam invadidos por significados externos que contaminem a obra com as tensões do mundo. A máxima reprodutibilidade da obra lhe dá um caráter não autoral, ou seja, o fato da obra poder ser refeita por qualquer pessoa mergulha-a no domínio público. É que retirando seu poder de autoria, aumenta-se seu poder de circulação.

Diz o artista: "A maior parte das minhas obras pode ser reconstruída; a preocupação é fazer obras libertas do autor, da corporeidade que legitima o original. Queríamos nos libertar da aura do original".



A MORTE NO SÁBADO - ANTONIO HENRIQUE AMARAL

A série de quatro obras denominada "A morte no sábado (1975/6), de Antonio Henrique Amaral, enfocam o assassinato de Herzog. "A morte no sábado - tributo a Vladimir Herzog" (1975) e "Ainda a morte no sábado" (1976) são exemplares na descrição alegórica da violência militar sobre o corpo dos presos políticos torturados.

Em "A morte no sábado - tributo a Vladimir Herzog" a oposição entre formas orgânicas e metálicas num jogo de violência é o que predomina nas telas. Sobre um fundo escuro, como que um corpo manchado por pancadas aparece em cores vermelhas, amarelas e brancas uma espécie de representação das vísceras sendo perfuradas por quatro garfos.

Como um "troféu da repressão, garfos erguem o corpo reduzido a um monte de carne ensanguentada". Peles se abrem para fora, depois de rasgadas; veias surgem em meio ao amontoado de gorduras e tripas. O tom vermelho predomina, nos fazendo imaginar órgãos sujos de sangue.

O contraste produzido pelo encontro do metal com a carne reforça a violência da cena. Numa espécie de grande zoom, podemos ver de perto o estrago que se produz. Nesta alegoria sobre Herzog, revela-se a causa de sua morte: a tortura.

Em "Ainda a morte no sábado", mais uma vez o artista retoma a oposição violenta entre metais e vísceras. Desta vez, acrescenta um novo elemento, uma espécie de "coroa de Cristo", que acompanha e ajuda o garfo a perfurar a carne.

Gorduras brancas abundam ao lado das vísceras, sendo também ultrapassadas pelos objetos metálicos. O recurso ao zoom novamente é usado. O título faz referência ao dia da prisão de Herzog e de sua morte.

Em entrevista, Antonio Henrique conta sobre a criação de suas obras com a temática da morte de Herzog.

Jardel: Falemos do caso Herzog. Como foi a notícia da morte dele e esses seus quadros sobre ele?

A notícia da morte dele... eu me lembro até hoje, foi manchete em todos os jornais... Era um cara de trinta e poucos anos, jovem, diretor de jornalismo da TV Cultura. E de repente ele vai depor, todo mundo sabia que ele ia depor, e no dia seguinte aparece a notícia da morte dele. Foi um choque, saiu no Estadão em página inteira, no Jornal da Tarde. Sob esse impacto eu resolvi pintar quatro quadros que eram A Morte no Sábado ― Tributo à morte de Vladimir Herzog. O fato de os militares matarem uma pessoa dessa qualidade humana, cultural, foi um choque, e o cinismo brutal de tentar afirmar que tinha sido suicídio...! Um horror!

Jardel: Houve censura aos quadros nessa época ou não?

Não foram imediatamente expostos. Quando completou um ano da morte dele eu os doei para o Sindicato dos Jornalistas. Depois começaram a serem expostos em exposições.

Jardel: Mas o povo não tinha acesso...

Não tinha. O povo sempre teve pouco acesso à cultura, o povo sempre teve muito acesso ao futebol, às noticias sobre futebol, com o apoio de toda a elite política que se protege à sombra do noticiário futebolístico... O fato de a gente fazer coisas que não são imediatas, que não são claras, exige que as pessoas pensem, se informem, sintam, abram a cabeça. É o papel civilizador da arte. Música popular é de consumo imediato, o cara não precisa pensar, a letra entra, sai. Claro que tem compositores como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gil, Vinicius, Tom Jobim e tantos outros que fazem musica para a pessoa ficar mais alerta. Mas, em geral, o povo brasileiro gosta mesmo é de música que entra por um ouvido e sai pelo outro...! "Eguinha Pocotó" e coisas do gênero...!

Décia: A fase das bananas foi mais zombando, mas o caso Herzog foi um grande impacto que o fez expressar seu sentimento de revolta?

Exatamente. Porque houve outras mortes. Mas foi emblemática a morte de Herzog. Também o caso do filho da Zuzu Angel, o caso do Paiva, que foi jogado do avião... Como o Herzog era um jornalista da TV Cultura, tinha uma projeção maior do que o Paiva, que era um ativista. No fundo essa obra vale para todos os mortos, vítimas da violência da ditadura militar.


Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 30/9/2014

Mais Jardel Dias Cavalcanti
Mais Acessadas de Jardel Dias Cavalcanti em 2014
01. O assassinato de Herzog na arte - 30/9/2014
02. Simone de Beauvoir: da velhice e da morte - 29/7/2014
03. As deliciosas mulheres de Gustave Courbet - 3/6/2014
04. A Puta, um romance bom prá cacete - 2/12/2014
05. Wilhelm Reich, éter, deus e o diabo (parte I) - 2/9/2014


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Aventuras De Pi
Yann Martel
Nova Fronteira
(2012)



Shantala: Uma Arte Tradicional Massagem Para Bebês
Frédérick Leboyer
Ground
(1998)



Delícias Divinas
Nigella Lawson
Best Seller
(2015)



Revista Piauí 111
Revista Piauí 111
Sem



Os Três Príncipes Coroados - O Príncipe do Limo Verde 14ª edição.
Arnaldo de Oliveira Barreto biblioteca infantil 13
Melhoramentos



Buscando a Luz
Edison Carneiro
Aliança
(2011)



O Jogo de 1 Milhão de Dólares 297
Chassie L. West
Nova Cultural



Guerra Civil Americana
Peter Louis Eisenberg
Brasiliense
(1985)



Viagem ao Fim do Milênio
A. B. Yehoshua
Companhia das Letras
(2001)



Livro de Bolso Filosofia Semiocapitalismo
Paulo Ghiraldelli
Cefa
(2022)





busca | avançada
63387 visitas/dia
2,0 milhão/mês